segunda-feira, 18 de novembro de 2019

DOIS BRASIS



Em 15 de novembro de 2019 se comemorou a implantação da República no Brasil.

Em 15 de novembro de 2019 se lastimou o fim da Monarquia no Brasil.

Duas Formas de Governo: Monarquia e República. Dois mundos.

E por se falar tanto em dois mundos, e por ler tantos louvores à monarquia e tantas lástimas ao seu fim, como professor de História resolvi expor o que sei até agora.

Tentarei me ater aos fatos constatáveis, temeroso de cair naquilo que Mark Lilla chamou de “reacionarismo” em sua obra A Mente Naufragada (ainda que eu discorde de sua distinção entre reacionarismo, conservadorismo e progressismo). Fujo do anacronismo.



A monarquia brasileira costuma ser dividida nos seguintes períodos:

De 1808 a 1889 tivermos o período monárquico no Brasil, que comumente é assim subdividido:

- 1808 a 1822: governo de D. João VI.

- 1822 a 1831: Brasil independente, sob o governo de seu primeiro imperador, D. Pedro I: Primeiro Reinado.

- 1831 a 1840: Período regencial

- 1840 a 1889: Segundo Reinado (governo de D. Pedro II).

De 1889, ano da Proclamação da República, até a atualidade, vivemos no período republicano, cuja primeira fase é conhecida com República Velha:

- 1889 a 1930: República Velha (República Oligárquica, República do Café com Leite)

É verdade que durante a Monarquia foi estendido a todos os brasileiros, mesmo analfabetos, o direito ao voto, muito embora incluísse outras exigências como renda, por exemplo, mas exigência não descabida (na época, o valor exigido era razoável) nem extrema já que era um tipo de exigência comum em outras constituições do mundo como, por exemplo, a americana. Entretanto, não houve durante a monarquia uma efetiva tentativa de difundir a educação no país. O número de alfabetizados pouco mudou durante os quase oitenta anos de monarquia.

Por outro lado, já no início da República, e com a federalização do país, os Estados passaram a ser efetivamente responsáveis pela educação, o que elevou muito rapidamente a alfabetização no país (em comparação com o período monárquico). Assim, enquanto a República restringiu o direito ao voto aos alfabetizados, ampliou o número de alfabetizados.

Para se ter uma ideia, no Censo de 1890 somente 14,8 % das pessoas acima dos 04 anos sabia ler e escrever, no Censo de 1920 a taxa de alfabetização nacional havia duplicado: 28, 8 %.
“Mesmo se comparando com os países mais pobres da América do Sul, o Brasil educava uma porcentagem muito pequena de seus cidadãos.” (Vidal Luna)

Em relação à expectativa de vida, em 1872 (período monárquico, portanto) era de 20 anos, o que era extremamente baixa, comparável com os países mais pobres das Américas ou da Europa e, por incrível que pareça, bem inferior aos vizinhos do Sul. Em 1920 a expectativa de vida ao nascer já havia passado para 30 anos. Embora ainda baixa, em franco aumento.

Com relação à renda per capita, também encontramos grandes problemas no período imperial e chegando até 1910. Veja o gráfico 1.7 onde se percebe pouco, na verdade, neutro, crescimento da renda per capita em 110 anos (1800 a 1910), em comparação com outros países, principalmente Estados Unidos.

Sobre o crescimento econômico do país, durante a República Velha o PIB aumentou com uma taxa de crescimento anual de 3,7%; ”porém, dado o forte crescimento da população nesse período (2,3%), o crescimento da renda per capita foi de 1,4% ao ano.”

“Na fase final do Império (1850 a 1889), o PIB per capita crescia a meros 0,34% por ano.” A partir daí houve um crescimento relevante, conforme o Gráfico 1.29.

Também a industrialização cresceu durante a República Velha, indicando inclusive que o período que vai de 1889 a 1930 não foi apenas uma “República dos coronéis”, ou uma “República de cafeicultores”. O crescimento industrial – São Paulo tomado como expoente maior – indica que um novo caminho para analisar o período deve ser tomado, fugindo do tradicionalmente ensinado. Gráfico 1.27


Nessa breve análise não se vê nada que possa indicar alguma superioridade do período Monárquico sobre o Período Republicano. Também não se pode estabelecer qualquer juízo que suponha que, permanecendo a monarquia no Brasil, as mudanças supra citadas não teriam ocorrido ou qualquer suposição que leve a crer que as mudanças seriam mais profundas ou mais tímidas. A bem do exposto, o período monárquico no Brasil, mais especificamente o Segundo Reinado, foi econômica e socialmente de estagnação e embora algumas poucas tentativas privadas de empreendedorismo tenham apontado aqui e ali foram sufocadas pelo controle estatal e pela centralização do poder.



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GRÁFICOS:







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Obs.: todas as citações em aspas são da obra de Francisco Vidal Luna.

Bibliografia principal:
1) História Econômica e Social do Brasil, Francisco Vidal Luna e Herbert S. Klein
2) Julio de Mesquita e seu tempo, vol. IV – O tempo econômico, Jorge Caldeira
3) História Econômica do Brasil, Jorge Caldeira

Bibliografia secundária:
4) A Ideia Revolucionária no Brasil, João Camilo de Oliveira Torres
5) Da Monarquia a República, momentos decisivos, Emília Viotti da Costa
6) História Geral do Brasil, Maria Yedda Linhares (Org.)

segunda-feira, 4 de novembro de 2019

INTRANSCENDÊNCIA SUBJETIVA DAS SANÇÕES


(Constitucional / Administrativo)

Parece razoável ou justo que alguém seja punido por ato ilícito ou ilegal praticado por outrem, sem que tenha concorrido de qualquer forma? A resposta parece merecer um redondo não.

Mas e quando o ato é praticado por uma pessoa jurídica de direito público interno, como um Estado da federação ou um Município? Ainda assim supõe-se que a resposta deve ser negativa. Imagine o município de São Fidélis tendo que pagar uma dívida contraída pelo município de Macondo,  utilizada irregularmente ou sem prestação de contas ou com contas prestadas incompletas? Não faria sentido.

Mas e quando a irregularidade decorre da administração do prefeito (ou governador) A e, após processo administrativo, a sanção seja aplicada quando já decorre a administração do prefeito (ou governador) B? A sanção é aplicada ao município, mesma pessoa, mesma subjetividade, portanto. Mas não parece extrapolar o âmbito da punição alcançar a administração de um prefeito (ou governador) que administra com esmero e correção?

Pois assim também entendeu o STF, por sua 1ª. Turma, em AC 2614/PE, AC 781/PI e AC 2946/PI, em 23 de junho de 2015 (Relatoria do Min. Luiz Fux): 

“O princípio da intranscendência subjetiva impede que sanções e restrições superem a dimensão estritamente pessoal do infrator e atinjam pessoas que não tenham sido causadoras do ato ílicito. Assim, o princípio da intranscendência subjetiva das sanções proíbe a aplicação de sanções às administrações atuais por atos de gestão praticados por administrações anteriores. A inscrição do Estado de Pernambuco no CAUC ocorreu em razão do descumprimento de convênio celebrado por gestão anterior, ou seja, na época de outro Governador. Ademais, ficou demonstrado que os novos gestores estavam tomando as providências necessárias para sanar as irregularidades verificadas. Logo, deve-se aplicar, no caso concreto, o princípio da intranscendência subjetiva das sanções, impedindo que a Administração atual seja punida com a restrição na celebração de novos convênios ou recebimento de repasses federais.”

Além disso, súmula do Superior Tribunal de Justiça e entendimento da Advocacia Geral da União seguem o mesmo desiderato:

Súmula 615-STJ: Não pode ocorrer ou permanecer a inscrição do município em cadastros restritivos fundada em irregularidades na gestão anterior quando, na gestão sucessora, são tomadas as providências cabíveis à reparação dos danos eventualmente cometidos.

Súmula 46-AGU: Será liberada da restrição decorrente da inscrição do município no SIAFI ou CADIN a prefeitura administrada pelo prefeito que sucedeu o administrador faltoso, quando tomadas todas as providências objetivando o ressarcimento ao erário.


ARQUIVOS DO INQUÉRITO PÚBLICO JK

 Vez por outra surge a controvérsia: JK foi assassinado ou foi vítima de homicídio? Inquérito foi instaurando, investigações feitas e, mais ...