OS JESUÍTAS E A EDUCAÇÃO
Aroldo
Rodrigues
“Certas transformações que repentinamente se verificaram nos
jesuítas na América Latina, causam especial preocupação para os que se ocupam
da educação entre nós. A recente repreensão do Papa João Paulo II ao Geral dos
jesuítas em Roma, onde assinalou os deploráveis erros doutrinários perpetrados
pelos jesuítas na América Latina e lhes recomendou que voltassem à tradição
inaciana, o recentemente processo de expulsão do Brasil movido pelo Ministério
da justiça contra um jesuíta espanhol, radicado em Minas Gerais e o triste
episódio nacionalmente conhecido como Crise
da PUC, onde o totalitarismo esquerdista teve incondicional apoio da
Reitoria daquela Universidade administrada pelos padres da Companhia de Jesus,
concorrem, de fato, para que se veja com inquietação os frutos da atividade
educativa dos jesuítas no país.
Ninguém de bom senso pode negar a influência benéfica da
Companhia de Jesus na educação brasileira, desde Anchieta até hoje, em todos os
níveis da educação, extrapolando até os limites do ensino formal e atingindo
outras formas de instrução, como constitui exemplo a Escola de Líderes
Operários iniciada na década de 50, e que se deve à ação dedicada e criadora do
eminente, dinâmico e esclarecido jesuíta – Pe. Pedro B. Velloso. Os colégios
dirigidos por jesuítas atingem, via de regra, elevado padrão de ensino e os
alunos que deles egressam não raro ocupam lugar de destaque na sociedade.
Várias casas de ensino superior no Brasil são dirigidas por jesuítas,
constituindo exemplo as Universidades Católicas do Rio, de Goiânia, de Recife, a
UNI-Sinos no Rio Grande do Sul etc. É enorme, pois, a responsabilidade dos
jesuítas no que tange à educação.
A súbita mudança de orientação dos jesuítas, todavia, suscita
séria apreensão, justamente no momento em que todos os esforços são empregados
para consolidar a democracia no Brasil.
Ao que tudo indica (tanto que o próprio Papa se viu na
contingência de alertar vigorosamente o Geral da Companhia) os jesuítas de hoje
optaram pela conciliação do marxismo com o catolicismo. E, a julgar-se pela
ação política de muitos deles, acham-se mais empolgados pelo primeiro que pelo
segundo. Na PUC RJ, por exemplo, onde me foi dado testemunhar a mudança de
orientação doutrinária da ordem jesuíta, há no momento três tipos de padres: os
marxistas declarados, que se ocupam de proselitizar os alunos nos primeiros
anos dos cursos, repetindo os tradicionais e cansativos refrões marxistas, sem
qualquer inovação ou criatividade; há o não marxistas, que ocupam cargos de
direção, e que chancelam toda a atividade marxista desenvolvida na
universidade, quer pelos padres quer pelos leitos; finalmente, há os não
marxistas, que de fato se opõem ao marxismo, mas que, no momento, estão
totalmente ostracizados e desempenham funções pouco relevantes no que tange à
orientação da universidade.
A opção totalitária de esquerda da PUC-RJ ficou flagrante
nos acontecimentos da Crise da PUC
no início deste ano e se acham amplamente documentada pela obra organizada por
Antônio Paim, que a Editora Artenova acaba de dar a lume: Liberdade Acadêmica e Opção Totalitária. O Professor Paim mostra,
com clareza meridiana, a adoção do totalitarismo esquerdista pela PUC-RJ soba a
direção de seu atual Reitor, Pe. João McDowell, e sob a inspiração de outro
jesuíta, antigo entusiasta da Ação Popular, o Pe. Henrique de Lima Vaz.
Se a opção totalitária de esquerda não se limita à PUC-RJ mas
parece ter-se transformado na política de ação dos jesuítas, o fato é assaz
preocupante. Que tipo de cidadão estarão os jesuítas formando em seus colégios
e universidades? É fácil, porém falso e
enganador, dizer que o que estão fazendo é, simplesmente, conscientizar os
alunos para os problemas sociais. O Pe. MacDowell, por exemplo, apressou-se em
assim se defender quando concluiu seu infeliz pronunciamento no início da Crise da PUC com a seguinte frase: “Nem
por isso a universidade se afastará de sua missão de despertar a
responsabilidade social de seus professores e alunos, de acordo com as
orientações da Igreja, alheia a qualquer ideologia”. No contexto em que está
inserida ou seja, tentativa de resposta às críticas de censura acadêmica (ver Liberdade Acadêmica e Opção Totalitária,
pag. 17) a frase chega a ser cômica. Ignorando-se este aspecto, todavia,
pode-se indagar: Alguém jamais insinuara que a universidade devesse afastar-se
de sua missão de despertar a responsabilidade social de seus professores e
alunos? Por acaso é tal missão prerrogativa dos totalitários da esquerda? Não
faz parte desta missão justamente formar os alunos dentro de um ambiente
pluralista e antisectário, para bem prepara-los para o pluralismo da sociedade
contemporânea? Não é, ademais, incompatível o despertar da responsabilidade
social com a prática da censura confessada por motivos ideológicos, tal
como perpetrada na PUC-RJ no lamentável e inequívoco episódio gerador da Crise
da PUC?
O mundo moderno tem, em meio a uma série de desvantagens, uma
vantagem singular. Além de conhecer todas as formas antigas de totalitarismo,
conheceu duas formas requintadas e modernizadas deste mal: o nazismo e o
marxismo. Faz-se mister que os educadores envidem esforços livres no sentido de
erradicarem de uma vez por todas a opção totalitária que Antônio Paim tão bem
analise no caso da Crise da PUC (ver obra citada acima).
É meu desejo sincero que a chamada do Papa à volta à ortodoxia
por parte dos jesuítas tenha o efeito salutar de provocar, em curso prazo, um
retorno destes educadores a uma atividade que, antes do desvario que os
acometeu, era de singular importância na educação dos brasileiros.
-------------------
Aroldo Rodrigues é
professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Foi professor
da PUC-RJ de 1957 a 1979.
Jornal O Globo, página 11, caderno OPINIÃO, edição de 11 de outubro de 1979.